O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Luís Roberto Barroso, decidiu, nesta quarta-feira (30), prorrogar o prazo de vigência da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) nº 828, que suspende os despejos e remoções forçadas durante o período de pandemia de Covid-19. A resolução foi tomada após intensa mobilização de movimentos e organizações sociais em todo país e estende a proibição de despejos e desocupações coletivas em áreas urbanas e rurais até junho deste ano.
Esta foi a segunda prorrogação da ADPF 828, apresentada em junho de 2021 pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) em parceria com a Campanha Despejo Zero. A primeira, concedida em dezembro, sustentava a vigência da medida até o dia 31 de março.
A decisão de Barroso foi comemorada por milhares de famílias em todo país e pelos manifestantes reunidos, nesta quarta-feira, em Brasília para o ato político “Brasil Sem Despejo: por terra, teto e trabalho”. Ao longo do dia a hashtag #BrasilSemDespejo chegou a liderar o ranking de assuntos mais comentados no Twitter.
Sob risco
Desde o início desta semana, movimentos e organizações sociais e milhares de famílias promoveram atividades e atos públicos com o lema “Brasil sem Despejo”. Segundo levantamento publicado na última segunda-feira (28) pela Campanha Despejo Zero, articulação que reúne mais de 175 organizações, entidades, movimentos sociais e coletivos em todo país, mais de 132 mil famílias corriam o risco de serem expulsas de suas moradias caso a liminar de Barroso não fosse prorrogada.
Ainda de acordo com os dados da campanha, 27.618 famílias já foram despejadas desde o início da pandemia no país. São Paulo, Rio de Janeiro e Amazonas são os estados que concentram o maior número de casos, sendo 6.017 em São Paulo, 5.560 no Rio, e 3.731 no Amazonas. Também chamam atenção os números de famílias despejadas no Paraná (1.706), Goiás (1.623), Pernambuco (1.595) e Ceará (1.472).
Em relação às famílias ameaçadas de perder a moradia, os estados que lideram a lista são São Paulo (42.599), Amazonas (29.231) e Pernambuco (17.210). Segundo a Campanha Despejo Zero, o número de famílias ameaçadas aumentou 602% nos últimos dois anos. No mesmo período, o número de famílias despejadas registrou um crescimento de 333%.
ADPF 828
Segundo a Campanha Despejo Zero, desde que foi concedida pelo ministro Barroso, a liminar referente à ADPF 828 garantiu diretamente a proteção de mais de 23 mil de famílias ao longo do último ano.
Ainda de acordo com a campanha, além da ADPF 828, a realização de despejos e remoções durante a pandemia desrespeita resoluções do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e do Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH), o Pacto dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais e o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos da Organização das Nações Unidas (ONU). As entidades da campanha também lembram que o cumprimento de ordens de remoção e despejo durante o período pandêmico também fere a Lei Federal 14.216/21, sancionada em outubro do ano passado após o Congresso derrubar o veto do presidente Jair Bolsonaro (PL).
A Campanha Despejo Zero destaca ainda que, embora tenha sido agravada nos últimos anos pela pandemia, a falta de moradia adequada é um problema estrutural das cidades brasileiras. Neste sentido, a advogada da ONG Terra de Direitos e integrante da campanha, Dayse Ribeiro, lembra que as famílias mais pobres seriam as mais afetadas pela decisão do STF.
“É fundamental a atuação do Supremo Tribunal a fim de continuar garantindo os direitos das populações mais vulneráveis nesse cenário de crise social, econômica e pandemia, mantendo a suspensão dos despejos. A falta de moradia agrava ainda mais os impactos da pandemia no Brasil, principalmente para as famílias pobres”, afirmou.