A Associação Mundial de Rádios Comunitárias (Amarc-Brasil) realizou no dia 12 de maio o segundo seminário do ciclo “Uma nova lei para as rádios comunitárias: marco regulatório e direito à comunicação”. O evento ocorreu na cidade de Arroio do Sal, litoral do Rio Grande do Sul, e foi promovido em parceria com a Rádio Tupancy, comunitária que funciona na cidade.
Cerca de 25 pessoas compareceram ao antigo cinema da cidade para participar da discussão. O seminário foi iniciado com uma saudação das autoridades locais da cidade e do estado do Rio Grande do Sul, que destacaram a importância da mobilização promovida por este debate e o papel que as rádios comunitárias cumprem na sociedade brasileira.
Em seguida, foi iniciada a mesa com a fala das entidades convidadas. Maria Pía Matta, presidenta da AMARC internacional, destacou a importância de tratarmos a questão das rádios comunitárias como um tema de direitos humanos. Segundo ela, as rádios comunitárias têm sido a experiência concreta de que é possível fazer uma comunicação que não seja pela empresa privada ou pelo Estado. Com relação à legislação para radialistas comunitários, ela afirmou que a aplicação do direito penal aos que não possuem autorização tem sido muito ruim. Isso acontece no Brasil e no Chile. “Um Estado que aplica o direito penal para aqueles que exercem a comunicação faz um ataque à liberdade de expressão”, afirmou Pia.
Dando continuidade, foi a vez de Luciano Gallas do coletivo Intervozes fazer sua intervenção. Ele afirmou que a lei de comunicação atual tem diversos pontos de divergência, o que tem criado no Brasil a situação de oligopólio da mídia. Luciano afirma que a lei está ultrapassada: “Ela não contempla nem a convergência de mídias que temos hoje.”. Com relação ao novo marco regulatório das comunicações, ele foi claro: “O marco regulatório deve prever a complementaridade do sistema público, privado e comunitário de comunicação, e também a criação de fundos públicos para estímulo à comunicação comunitária. Além disso, deve deixar que as comunidades decidam o alcance que devem ter.”
Joaquim Goular, da Associação Brasileira de Rádios Comunitárias do Rio Grande do Sul (Abraço-RS), destacou alguns pontos da lei atual que considera absurdos. “Não tem fundamento exigir que diretores da associação morem na área de transmissão das rádios. Não tem fundamento choque de frequência. Está faltando a prática de fazer decreto, de fazer a lei.”, afirmou.
Já o membro da Corte Interamericana de Direitos Humanos da OEA, Michael Camilleri, iniciou sua fala lembrando que a entidade considera há mais de 25 anos que os meios de comunicação social servem para materializar o exercício da liberdade de expressão. Michael destacou que “a alocação de licenças de rádio e televisão é uma decisão que tem um impacto definitivo sobre o direito à liberdade de expressão em seu duplo significado: o direito de todos se expressarem livremente e o direito de receber ideias e opiniões diversas.”. Ele disse ainda que por esta razão, a Corte Interamericana “considera necessário que o Estado reconheça legalmente a existência particular das emissoras comunitárias e que contemple reservas de espectro para este tipo de meio, assim como condições equitativas de acesso às licenças que diferenciem as realidades distintas dos meios privados não comerciais”.
Para finalizar a mesa, foi dada a palavra ao representante do Ministério das Comunicações, Javier Alfaro, que além das ações do minicom, como o Plano Nacional de Outorgas e novo decreto que está na Casa Civil, destacou a situação do quadro de funcionários da pasta atualmente. Segundo Javier, o quadro atual dificulta grande parte dos trabalhos, impedindo, por exemplo, a plena retomada das delegacias regionais nos estados. Sobre a lei, ele disse: “Também tenho interesse que a lei seja modificada. Não se pode punir as pessoas com uma lei de 1962 , quando estava começando a TV no país, ainda não tinha internet e nem celular. Tudo mudou. Quero que mude, mas não posso impor que se legisle sobre isso.”.
Em seguida o debate foi aberto ao plenário para destacar os pontos levantados pela mesa. A coordenadora do programa de Legislação da Amarc-Brasil, Taís Ladeira, fez questão de reafirmar o caráter do ciclo de seminários como forma de aglutinar propostas para uma nova lei que será apresentada ao governo em Brasília. Ela lembrou também que durante a elaboração da atual norma para rádios comunitárias, o Ministério abriu uma consulta pública que gerou cerca de mil propostas e nenhuma delas foi agregada à norma. Para Taís, “o Minicom não pode fazer de conta e fingir que fez consulta e não usá-las”.
Alan, da Abraço-RS, fez diversas críticas ao Ministério e sua política de submissão à Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão, Abert. Ele afirmou: “Na consulta pública só uma proposta foi aceita e foi da Abert. A primeira entidade consultada sobre rádio comunitária pelo ministro foi a Abert. O ministro se negou a ir no Congresso da Abraço.”. Em seguida, ele apontou diversos problemas da norma, da lei e do decreto elaborados pelo ministério. Alan também destacou a importância de as rádios se mobilizarem para conseguirem vitórias e mais espaço.
Em seguida, os palestrantes voltaram falar, ponderando as questões levantadas e fazendo suas considerações finais.
Na parte da tarde, foi montado um grupo de trabalho para discutir os 14 princípios elaborados pela Amarc e sugerir pontos para uma nova lei. Dioclécio Luz, fez uma apresentação sobre a legislação e abriu o debate com os demais.
Em seguida, o grupo discutiu o novo decreto apresentado pelo Ministério das Comunicações ponto a ponto, avaliando as questões que deveriam ser alteradas. Na avaliação de muitos, o decreto altera muito pouco o cenário atual das rádios comunitárias, mantendo limitações antigas e deixando muitos pontos em aberto.
Pedro Martins – secretário executivo da Amarc Brasil.