A cor lilás, o chapéu de palha, os cantos, as flores, os batuques e a peculiaridade dos tantos “brasis” que constroem a nação tomaram as ruas de Brasília (DF) na manhã desta quarta-feira (16). Segundo estimativas da Marcha das Margaridas e da Polícia Militar, o movimento reuniu mais de 100 mil trabalhadoras do campo, da floresta e da cidade na capital federal.
Entre as mulheres estava Chirlene Brito, diretora da Associação das Trabalhadoras Domésticas de Campina Grande e integrante da Federação Nacional das Trabalhadoras Domésticas (Fenatrad). A sindicalista saiu da cidade de Campina Grande, na Paraíba, no domingo (13), às 9h, e chegou a Brasília ao meio dia de terça-feira (15). Apesar da viagem desgastante, Chirlene estava com energia e ânimo para caminhar os cerca de seis quilômetros do trajeto até a Esplanada dos Ministérios.
“Há três anos que participamos desta Marcha tentando reconstruir o Brasil e também nos inserindo, mostrando que, nós, trabalhadoras domésticas, também temos direito e queremos ser livres como todas as mulheres, do campo, da cidade, das águas e das ruas. Saímos com muito amor, carinho e orgulho de fazer parte desta militância”, contou à Pulsar.
Assim como Chirlene, milhares de mulheres de todas as regiões do país viajaram por dias para participar da sétima edição da Marcha das Margaridas, que teve como principal lema a reconstrução do Brasil e a defesa do Bem Viver.
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Abertura oficial
A maioria das Margaridas chegou a Brasília na madrugada desta quarta-feira (16) para a Marcha, mas o evento começou no dia anterior com uma programação extensa de seminários, painéis e oficinas. A abertura oficial do encontro ocorreu na noite de terça-feira e contou com a participação de ministras e ministros do governo federal, além de deputadas e senadoras em um ato político realizado no palco principal do Pavilhão Parque da Cidade.
Para a deputada federal Dandara Tonantzin (PT-MG), que é relatora do projeto que altera a Lei de Cotas (Lei 12.711/12) e prevê a avaliação do programa a cada 10 anos, a Marcha das Margaridas tem o papel de apontar uma diretriz política para o governo federal.
“O povo tem que pautar o governo, os anseios são muitos, as mudanças que precisamos fazer são muitas. As mudanças são enormes e é importante ter povo organizado cobrando ações do governo, dos estados, municípios, para transformar a vida das mulheres do campo, das águas e das florestas. É importante porque mostra que as mulheres sempre lideraram as principais marchas e organizações do país e dessa vez a Marcha se consolida como a maior manifestação de ruas de mulheres da América Latina”, disse à Pulsar.

Conquistas
Após a caminhada sob sol forte em meio a uma intensa seca que atinge Brasília, as Margaridas chegaram ao palco final montado na Esplanada dos Ministérios, onde foram feitos os anúncios em resposta à pauta apresentada pela organização da Marcha.
Em relação às demandas feitas ao poder Legislativo, a deputada Maria do Rosário (PT-RS) anunciou a aprovação do nome de Margarida Alves no Livro dos Heróis e Heroínas da Pátria e a instituição de um grupo de trabalho com a deputada Benedita da Silva (PT-RJ) para organizar o acompanhamento de toda pauta recebida.
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Por sua vez, a ministra das Mulheres, Cida Gonçalves, anunciou a assinatura de três portarias: a que reinstala o Fórum Nacional de Políticas para as Mulheres Agricultoras do Campo, da Floresta e das Águas; a que garante o Fórum de Discussão para a questão das mulheres pescadoras, marisqueiras e das águas com o objetivo de desenvolver uma política nacional para o setor junto ao Ministério da Pesca; e a que trata da criação de uma Ouvidoria Itinerante, a “OI, Mulheres!”.
A ministra também prometeu a entrega de 270 unidades móveis além de carros, vans e até barcos e lanchas para transportar equipamentos e profissionais de saúde, de delegacia e outras áreas necessárias ao atendimento das mulheres, sob responsabilidade dos municípios. O pacote de ações da pasta também inclui o trabalho junto aos Correios para que as mulheres possam mandar cartas que cheguem direto ao gabinete da ministra.
Já o ministro do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar (MDA), Paulo Teixeira, comunicou a criação de 90 mil quintais produtivos; a destinação de R$25 milhões para serem aplicados em práticas agroecológicas, com metade do valor destinado a mulheres; o lançamento do Programa Cidadania e Bem Viver, que, junto com os Ministérios do Trabalho, das Mulheres e da Previdência, pretende retomar o Programa Nacional de Documentação da Mulher Trabalhadora Rural, criado no primeiro mandato do presidente Lula (PT); e o lançamento do Programa Emergencial de Reforma Agrária, para assentar 7.200 famílias, sendo 5.700 com novos assentamentos e 1.500 com crédito fundiário.
O MDA ainda anunciou a regularização de 40 mil famílias em assentamentos; a duplicação dos pontos das mulheres, que terão 10 pontos a mais que homens, para entrar no Programa de Reforma Agrária; a destinação de R$ 300 milhões para crédito de instalação para as famílias da reforma agrária; e a assinatura do decreto que cria o Grupo de Trabalho para construir o Plano Nacional de Juventude e Sucessão Rural. Também estão previstas a instituição da Comissão Nacional de Enfrentamento à Violência no Campo e a destinação de R$ 100 milhões para compra de leite e incentivo de aumento de produtividade da cadeia produtiva de leite e derivados no Brasil.
Durante o ato de encerramento da Marcha, o presidente Lula assinou oito decretos que tratam sobre:
- a instituição do Programa Quintais Produtivos para Mulheres Rurais;
- a retomada da Reforma Agrária com atenção a famílias chefiadas por mulheres;
- a instituição da Comissão de Enfrentamento à Violência no Campo;
- a criação do Grupo de Trabalho Interministerial para o Plano Nacional de Juventude e Sucessão Rural;
- a instituição do Programa Nacional de Cidadania e Bem Viver para as Mulheres Rurais;
- a instituição do Pacto Nacional de Prevenção aos Feminicídios;
- a retomada da Política Nacional para os Trabalhadores Rurais Empregados;
- e a retomada do programa Bolsa Verde, de apoio à conservação ambiental.
A Marcha das Margaridas é coordenada pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag), federações e sindicatos filiados e 16 organizações parceiras e ocorre a cada quatro anos. Em 2023, o evento contou com a participação de representantes de 33 países.
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Especial
A cobertura jornalística “Especial Margaridas 2023: Mulheres pelo Bem Viver” é uma realização da Agência Informativa Pulsar Brasil, um programa da Associação Mundial de Rádios Comunitárias (Amarc Brasil), em parceria com o Centro das Mulheres do Cabo (CMC) e o apoio da Coordenadoria Ecumênica de Serviço (Cese).