No primeiro dia outubro, o Conselho de Comunicação Social (CCS) se reuniu pela terceira vez. Na semana passada foi publicada a transcrição que deixa claro que o CCS ainda está ocupado com a constituição da sua própria infraestrutura. (1) Parece ser um processo técnico de pouca relevância social, mas não é. Como demonstra esse documento, foi discutido, sobretudo, a estrutura de um futuro site que tenha caráter interativo. “Com essas mudanças é possível enviar sugestões para os membros do Conselho e acompanhar as notícias sobre os trabalhos desenvolvidos e a repercussão nas redes sociais”, informa uma nota da Agencia do Senado. (2)
Levando a sério a ideia da interatividade significaria que sugestões enviadas pelos cidadãos deveriam potencialmente provocar uma repercussão no trabalho do CCS e até transformar-se em eixos de trabalho. Mas se isso pode e deveria acontecer, ainda é um tema controverso como deixou claro o debate da reunião. Contrário a uma postura ativa e propositiva do conselho pronunciou-se, por exemplo, o Nascimento Silva que insistiu que as atividades deveriam partir sempre de “um diagnóstico dos projetos aprovados no Congresso ou em tramitação nas Comissões de Ciência e Tecnologia da Câmara e do Senado.” Dito de outra forma: a função do CCS seria auxiliar e só auxiliar, ponto.
Outra expectativa expressou a conselheira Maria José Braga, que vê o CCS “como órgão auxiliar [do Congresso] que deve ser também propositivo.” Essa ideia é apoiada por mais membros, como por exemplo o Alexandre Kruel Jobim, que acredita que “seria inaceitável – ser um Conselho completamente passivo, esperando que o Congresso chame para nós discutirmos.” Entretanto, segundo ele, existe um problema: uma atuação ativa do CCS poderia implicar “uma coisa inconstitucional e ilegal” porque o atual regime interno do conselho não a permite.
Ainda que o conselho mude o seu estado legal está em xeque a pergunta sobre quão ativo deveria ser o CCS. “A partir do momento em que o Congresso verifica que o Conselho tem a agregar, em temas comuns… Isso não quer dizer que não possamos aqui discutir e eleger as prioridades que o Conselho entende”, disse Kruel Jobim e agrega: “Mas eu não gostaria que o Conselho tivesse a pretensão de pautar os Parlamentares, porque isso seria, com todo respeito, igual ao que aconteceu e, na minha visão, gerou certo esvaziamento do Conselho em gestões anteriores”.
Um interessante estudo sobre as gestões anteriores (2002-2006), do consultor legislativo Bernardo F. E. Lins, publicado em setembro deste ano sob o título “Conselho de Comunicação Social: Motivação, Objetivos e Atuação” também atribuía aos CCS anteriores uma “eficácia limitada”, mas não por um excesso de recomendações senão por falta de articular de forma clara as suas propostas auxiliares: “Por um lado, não logrou oferecer manifestações ou avaliações que sensibilizassem a sociedade a respeito do estado da comunicação social brasileira, de sua regulação e das relações entre mídia e Estado. Embora tenha conduzido analises relevantes acerca de vários temas, a exemplo da concentração da mídia no Brasil e da revisão da lei da TV por assinatura, a maior parte dos registros produzidos se limitou às atas e pareceres registrados na imprensa oficial. Não houve um debate público vigoroso que refletisse as preocupações e os achados do Conselho. Por outro lado, o Conselho não se mobilizou na crítica ou na defesa das atividades legislativas concernentes à comunicação social.” (3)
Para essa defesa, mesmo guardando uma posição estritamente auxiliar, não faltaram ao CCS passes para gols, conclui outro estudo de José de Sousa Paz Filho, do ano passado (4). “Nas últimas décadas, tem-se observado o crescente interesse do Congresso Nacional pela discussão de temas relativos à Comunicação Social e à Liberdade de Expressão.” Um dos assuntos mais debatidos e alvo de 38 iniciativas legislativas foi o serviço de radiodifusão comunitária. Nesse ponto vale chamar a atenção sobre o fato de que, até o entendimento mais passivo e auxiliar do CCS, inclui a “função de promover a governança no que diz respeito à regulação da comunicação social” (3). E uma das contribuições mais importantes da esfera legislativa é, sem dúvida, fazer e reformar leis.
“No entanto, poucas propostas de iniciativa do Poder Legislativo foram transformadas em lei nos últimos anos,” analisa Sousa Paz Filho. “Todavia, caso a promessa de encaminhamento pelo Governo da proposta do novo marco regulatório da comunicação social eletrônica venha a se concretizar, há expectativa de que os projetos em apreciação na Casa possam contribuir de forma mais efetiva para o aperfeiçoamento da legislação em vigor”. (4)
Auxiliar ou propositivo – aparentemente uma possível reforma do regime interno ocupará as reuniões do CCS ainda por um bom tempo. Mas, além de um discurso técnico sobre a legalidade ou ilegalidade das suas atuações, seria interessante debater também como se pode melhorar sua contribuição à governança no que se refere à Comunicação Social e à Liberdade de Expressão. Aparentemente, nesse processo as ideais da sociedade não são sempre bem-vindas. É, por exemplo, o caso de Miguel Angelo Cançado que propôs, na terceira reunião do conselho, “estabelecer uma linha de objetividade e até de celeridade” para o futuro trabalho. Apesar disso, a sua motivação é justamente que a ação do CCS seja pautada pelo Congresso e não “pela própria sociedade” (1).
Enquanto não há consenso do CCS nesse ponto, faz pouco sentido declarar como interativo um site web. Por que qual seria a motivação para um cidadão ou cidadã publicar uma sugestão na página web de um órgão que não queira ouvir pautas da sociedade civil? Interatividade é outra coisa. Vamos ver se isso vai acontecer no trabalho geral do CCS, mas também no caso do novo marco regulatório da mídia – uma demanda histórica que ainda espera para virar lei (5).
Nils Brock
Documentos consultados
(1) Notas Taquigráficas da Reunião 01.10.12 (PDF)
(2) Conselho de Comunicação Social terá site interativo
http://www12.senado.gov.br/noticias/materias/2012/10/01/conselho-de-comunicacao-social-tera-site
(3) Estudo de Bernardo F. E. Lins, Consultor Legislativo da Área XIV Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática intitulado “Conselho de Comunicação Social: Motivação, Objetivos e Atuação, Setembro 2012 (PDF)
(4) Estudo de José de Sousa Paz Filho. Proposições em tramitação no congresso nacional sobre comunicação social e Liberdade de Expressão. Julho 2011 (PDF)
(5) PULSAR Brasil. Novo Conselho de Comunicação Social discutirá marco regulatório
http://www.brasil.agenciapulsar.org/nota.php?id=9127