No dia do anúncio da inclusão da Coronavac no Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação contra Covid-19 para o público de 6 a 17 anos de idade (21.jan.2022), os repórteres que estavam no saguão do Ministério da Saúde foram chamados às 18h30 a participar de uma coletiva. Em seguida, esses jornalistas começaram a avisar outros colegas de profissão que não estavam ali nem teriam a oportunidade de saber do evento até então. Até enviar um aviso às 18h54, em grupo fechado do Telegram, dois minutos após a transmissão ter sido iniciada no Facebook, a pasta não havia informado se o pronunciamento seria transmitido nas redes sociais.
O episódio não foi o único nem o primeiro. Em meio ao alastramento da variante ômicron – com 1,3 milhão de casos registrados no país na última semana, o maior número computado para sete dias -, ao debate sobre a vacinação infantil e ao apagão de dados epidemiológicos que durou 35 dias, seis repórteres relataram à Abraji dificuldade na cobertura do combate do Ministério da Saúde à pandemia de covid-19.
De acordo com os depoimentos, os avisos de coletiva têm sido feitos em cima da hora desde dez.2021, em ao menos quatro situações, quando estavam em pauta assuntos de grande interesse público, como o ataque hacker ao Ministério da Saúde e o debate da imunização de crianças. Os profissionais pediram para ter suas identidades resguardadas para evitar represálias a sua atuação profissional.
Em alguns dos eventos, o Ministério limita a audiência a cinegrafistas e repórteres cinematográficos, sob alegação de prevenção sanitária contra a covid-19. Mesmo nas ocasiões em que a participação de jornalistas é permitida, não é possível fazer perguntas ao ministro Marcelo Queiroga.
“A menos que o governo seja acionado para anunciar algo extremamente emergencial, coletivas de imprensa podem ser planejadas”, avalia a jornalista e pesquisadora doutora na Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), Sabine Righetti. Para a especialista, que comanda a Agência Bori, de divulgação científica para jornalistas, seria esperado, em uma situação pandêmica, que o Ministério da Saúde mantivesse conversas periódicas e sistemáticas com a imprensa em dias e horários fixos na semana.
Righetti afirma que, se o governo entende que as coletivas estão causando aglomeração, poderia, em quase dois anos de ambiente pandêmico, pensar em soluções: “coletivas em ambientes abertos, minicoletivas com grupos menores de jornalistas ou a garantia de que os repórteres consigam fazer intervenções mesmo que estejam acessando remotamente a coletiva”.
“É preciso sempre lembrar que a intervenção do jornalista é a intervenção da sociedade. Um governo que faz declarações sem ser questionado pela imprensa não está dialogando com a sociedade”, acrescenta Righetti.
Os repórteres afirmam ser atendidos pelo ministro em frente à portaria do Ministério da Saúde, mas, mesmo no fim das coletivas, durante a saída do ministro da bancada, são impedidos de fazer perguntas pelos seguranças da pasta, que impedem o tradicional quebra-queixo, quando repórteres fazem perguntas rápidas e profissionais de rádios e Tv gravam suas sonoras.
Especialista em administração pública e observadora do avanço da pandemia no Brasil desde o princípio, a professora da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP, Lorena Barberia, afirma que as coletivas de imprensa são, em norma, os momentos em que o governo presta contas, esclarece dúvidas e se mostra transparente. “Se o Ministério não consegue responder a uma pergunta, deveria, inclusive, depois da entrevista, se reunir para encontrar soluções e informar a sociedade”.
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