A Associação Mundial de Rádios Comunitárias sub-região Brasil (Amarc Brasil) completa, nesta quinta-feira (22), 27 anos de atuação em defesa da democratização da comunicação e do fortalecimento da comunicação comunitária e popular no país.
Criada em 1995, a Amarc Brasil faz parte da regional América Latina e Caribe da Associação Mundial de Rádios Comunitárias (Amarc) e, hoje, conta com mais de 50 associadas entre rádios comunitárias e educativas, centros de produção, associações e ativistas.
Ao longo dos quase 30 anos de história, além de contribuir com a formação de comunicadores e comunicadoras em todo país, a associação participou ativamente de momentos históricos da luta pelo direito à Comunicação no Brasil, como a organização do Fórum Nacional de Democratização da Comunicação (FNDC) e a discussão em torno da criação da Lei de Radiodifusão Comunitária (Lei 9.612/98).
De acordo com Pedro Martins, jornalista e representante nacional da Amarc Brasil, uma das principais características da organização é seu caráter de rede. Segundo ele, a rede “solidária, colaborativa e integrada” da Amarc proporciona debates e trocas de experiências que resultam na organização de projetos, ações e até mesmo na formulação de políticas públicas.
“A Amarc Brasil tem uma trajetória importante na construção do movimento de rádios comunitárias, que eu considero como um dos grandes movimentos que, nos últimos 30 anos, tiveram conquistas concretas para a democratização da comunicação no Brasil”, afirmou.
Para Manina Aguiar, ativista e coordenadora do programa “Rádio Mulher” do Centro das Mulheres do Cabo (CMC), em Pernambuco, participar da rede da Amarc Brasil lhe trouxe “a questão do pertencimento”, principalmente no que diz respeito às lutas sociais dos povos latino-americanos.
“A Amarc me fez acreditar que nós, com a nossa força e, principalmente, com o contato e o conhecimento de outras comunidades e povos podemos, sim, fortalecer a nossa caminhada. São tantas experiências inspiradoras no campo latino-americano sobre a atuação das rádios comunitárias com sua potência e diversidade, com o seu trabalho de ampliar os espaços revolucionários e de transformar a nossa América Latina a partir da comunicação da nossa voz, da nossa fala”, comentou.
“Eu agradeço a todas e todos que fazem parte da Amarc e que fizeram da minha vida um campo político em que posso estar, passo a passo, lutando por direitos, acreditando na vitória e semeando o esperançar”, completou Manina.
Democratização
Segundo a jornalista e integrante do Conselho Político da Amarc Brasil, Taís Ladeira, uma da principais frentes de atuação da Amarc Brasil é a formação de comunicadoras e comunicadores comunitários.
Ao longo dos 27 anos de existência, foram centenas de comunicadores em todo território nacional que participaram de cursos, oficinas, seminários e outras ações. De acordo com Taís, além de questões técnicas e de gestão das associações e emissoras locais, as formações incluem reflexões sobre “participação das mulheres, questões de gênero, legislação, relação com o Estado e relação com a comunidade”.
Ainda sobre a contribuição da Amarc na luta pelo direito à Comunicação no Brasil, a jornalista destacou o trabalho desenvolvido no processo de elaboração da Lei de Radiofusão Comunitária (Lei 9.612/98). Um processo que, segundo ela, chegou a envolver a organização da Amarc em outros países da América Latina.
“A lei 9.612/98 nos colocou numa condição de desigualdade muito grande em relação aos demais sistemas de de comunicação garantidos na Constituição brasileira e isso fez com que o programa de legislação da Amarc no Brasil tivesse que realizar uma série de seminários, ações e diálogos com o governo, participando inclusive do Conselho de Rádio Digital e outros tantos momentos que foram muito significativos pra gente”, explicou.
Novos desafios
Ao analisar os desafios da Associação nos próximos anos, Taís afirma que “a atuação da Amarc será sempre na perspectiva de aumentar a diversidade do que é produzido nos veículos brasileiros de comunicação e de alargar a possibilidade de acesso da sociedade brasileira aos meios de produção da comunicação”.
Em relação ao contexto político inaugurado com a eleição de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para a presidência da República, a jornalista reconhece que o novo governo representa “uma retomada do fortalecimento da democracia brasileira”, mas pondera que os que os desafios da Comunicação no país seguem “postos e evidentes”.
Como o próprio presidente eleito tem dito em entrevistas, ela sublinha que, hoje, a Comunicação deve ser entendida como um dos pilares da democracia “para que aconteça o combate às fake news, para que o povo brasileiro seja melhor informado e para que as políticas públicas consigam chegar ao conjunto da população”.
Além da mudança no contexto político, a integrante do Conselho Político da Amarc Brasil comenta também sobre as mudanças que têm ocorrido no âmbito das Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs), em especial no que se refere à convergência midiática.
“Nós não podemos mais pensar que uma organização como a Amarc vai atuar na luta pelas rádios comunitárias pensando essas rádios apenas como emissoras que estão na antena e que distribuem seus conteúdos através de transmissores. É preciso pensar também em termos de webradios e de outras iniciativas que cumpram com a função da comunicação comunitária neste cenário de convergência midiática”, pontuou.
Radiodifusão
Também em relação às perspectivas para os próximos anos, Pedro Martins avalia que 2023 será um ano de reorganização tanto para o movimento das rádios comunitárias, como para o movimento mais amplo pela democratização da comunicação no país.
“É um desafio enorme perante o desmonte que a gente viveu e perante as dificuldades que o próprio movimento vive hoje. Mas é um desafio que nós vamos ter que enfrentar e que faz parte da construção para o próximo período”, analisou.
Sobre as demandas colocadas pelas novas tecnologias e gêneros midiáticos, o representante nacional da Amarc admite a necessidade de renovação das práticas e reflexões, sobretudo, no que se refere à formulação de políticas públicas para o setor da comunicação comunitária. Mas, ainda assim, destaca a importância de que a associação não abandone a luta histórica em torno do direito à radiodifusão no país.
“Quando se fala em democratização da comunicação, existe uma preocupação lógica e necessária com o campo da internet, com a democratização do acesso e também com o controle social das grandes mídias e corporações. Mas a gente quer debater também política para a radiodifusão e principalmente para radiodifusão comunitária. Esse debate não está morto! Ainda se disputa muito as concessões de rádio e TV e é importante a gente também ter essa luta pelo espectro no nosso horizonte”, concluiu.