Nesta segunda-feira (11), os mais de sete mil indígenas de 200 povos reunidos no Acampamento Terra Livre 2022, em Brasília, marcharam até o Ministério de Minas e Energia em protesto contra a expansão dos garimpos em territórios indígenas. Além da marcha “Ouro de Sangue”, a programação do oitavo dia de mobilização também contou com a primeira plenária nacional LGBTI+ da história do ATL.
Desde o início da 18ª edição, no dia quatro deste mês, os participantes da maior mobilização popular do movimento indígena brasileiro já promoveram atos, debates e plenárias para discutir temas que vão desde a demarcação de Terras Indígenas (TIs) e a proteção os povos isolados até o lançamento de candidaturas de mulheres indígenas para as eleições deste ano.
Ouro de Sangue
Além de protestar contra o aumento da invasão de garimpeiros em territórios indígenas, a marcha realizada nesta segunda-feira reforça a luta pela derrubada do Projeto de Lei 191/2020, que tramita no Congresso Nacional e propõe a abertura das TIs para a exploração em grande escala de empreendimentos ligados à mineração, hidrelétricas e grandes projetos de infraestrutura.
De acordo com a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), uma das organizadoras do ATL 2022, se o PL 191 for aprovado pelo Congresso, “vai derramar lama e sangue por todo Brasil”.
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Ao longo do trajeto entre o Eixo Monumental do Complexo Cultural Funarte e o Ministério de Minas e Energia, os manifestantes carregaram faixas e réplicas de barras de ouro manchadas de tinta vermelha. “Fiquem com seu ouro de sangue. Queremos nossa terra livre. PL 191 não!”, afirmaram os indígenas. Nas redes sociais, a Apib acrescentou: “Basta de sangue Indígena derramado pela ganância dos garimpos. Os dias do governo Bolsonaro estão contados e a mineração ilegal também”.
Histórico
Também nesta segunda-feira, os indígenas lançaram o “Manifesto Colorindo a Vida em Defesa do Território” e realizaram a primeira plenária nacional dos indígenas LGBTI+.
Para Erisvan Guajajara, da Mídia Índia, o evento foi não apenas histórico como necessário para que indígenas LGBTIs “não sigam morrendo com o preconceito, impregnado no discurso de ódio”.
“Estamos nas aldeias, nos campos, na rua, na cidade e vamos continuar ocupando todos os espaços pois o nosso colorido da resistência está aqui para afirmar que nossa a luta é pela vida, pelos nossos direitos. Basta de racismo, basta de transfobia, basta de violência. Tire seu preconceito do meu caminho que irei passar com o meu cocar”, afirmou o comunicador.
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Um dia antes, no sábado, os participantes do ATL 2022 se somaram aos Atos Nacionais pelo Fora Bolsonaro. Já na quinta (7) e sexta-feira (8), foi a vez das mulheres indígenas compartilharam suas vivências, conhecimentos e emocionarem as milhares de pessoas presentes no Acampamento.
Com o tema “Nossas Vozes Ancestrais Retomando o Brasil: Demarcar Territórios e Aldear a Política”, mulheres de povos originários de diferentes biomas do país falaram sobre a ambição de alcançar espaços na política institucional e lançaram mais de 10 pré-candidaturas aos cargos de deputada federal e estadual nas próximas eleições. Para Sônia Guajajara, coordenadora executiva da Apib, “já passou do tempo de as mulheres indígenas ainda estarem em papéis secundários”.
“Hoje, nós mulheres, estamos presentes em muitos espaços, de participação, de controle social, nas universidades, mulheres profissionais, mulheres cacicas e mulheres parlamentares. Hoje podemos sim participar e construir um Brasil que caibam todas nós. Somos muitas e diversas. Estamos aqui em nome das que nos antecederam e daquelas que ainda virão”, afirmou a coordenadora.
Povos isolados
A programação do Acampamento Terra Livre ainda contou com debates sobre os povos indígenas isolados. Durante a mesa “Pelas vidas dos povos indígenas isolados e de contato recente” lideranças dos povos originários falaram sobre os povos indígenas que escolheram viver longe da “civilização imposta”.
Segundo as lideranças que participaram do debate, tratam-se de povos que, durante séculos, resistem à colonização e a processos de violência. A opção pelo isolamento, seria uma forma de buscar maior controle sobre as relações que estabelecem com grupos ou pessoas que os rodeiam e de continuar vivendo com seus usos e costumes. Ao longo do debate, as lideranças presentes se solidarizaram com os povos que seguem vivendo de forma autônoma na floresta.
“Nós exigimos respeito. Estamos usando essa língua maldita porque fomos forçados, fomos humilhados. Vimos nossas crianças crescendo e morrendo. Hoje o que está acontecendo na Amazônia, nós já sofremos. Por isso estamos aqui para dizer que vocês não estão sozinhos. Nós estamos juntos. Esta casa é dos povos originários do Brasil”, afirmou o cacique Júnior Pataxó, do Sul da Bahia.
Demarcação
Ainda na primeira semana do ATL, os indígenas realizaram, na quarta-feira (6), a marcha “Demarcação Já” em defesa da demarcação dos territórios e “contra a agenda anti-indígena do governo brasileiro”.
O destino final da marcha foi o Congresso Nacional, onde tramitam projetos que violam os direitos dos povos originários, como o PL 191/2020 e o PL 490/2007, que inviabiliza, na prática, a demarcação de terras indígenas.
Os manifestantes também lembraram que a tese do Marco Temporal, que restringe o direito das comunidades às terras que tradicionalmente ocupam, deve ser julgada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em junho de 2022.